Luiza Trajano: ‘Não depende da economia, negócio bom a gente compra’

Empresária minimiza queda das ações, diz que varejista vai abrir até 50 lojas este ano e comemora marca de 200 mil sellers na plataforma.

Presidente do Conselho de Administração da Magazine Luiza, a empresária Luiza Helena Trajano diz não se preocupar com o mau momento da varejista na Bolsa (as ações do Magalu caíram 67,59% no primeiro semestre). Segundo suas palavras, ela “nem olha”: “O importante é que a empresa está com caixa muito bom, graças a Deus”. E avisa que, após a varejista comprar 21 empresas nos últimos três anos, não vai pisar no freio, mesmo com o cenário econômico adverso: “Negócio bom a gente compra”.

Pela primeira vez, Luiza será garota-propaganda da marca, na Caravana Magalu, que começou em maio e chega agora em João Pessoa, na Paraíba. No evento, a empresa capta vendedores para sua plataforma, que bateu na semana passada 200 mil sellers.

Em entrevista ao GLOBO, concedida dois dias antes de ir à Bienal de São Paulo apresentar o livro sobre ela escrito pelo jornalista Pedro Bial, Luiza conta ainda que pegou “mais uma causa”: mudar o mercado livreiro para evitar o sufoco das pequenas livrarias no país;

O primeiro semestre foi bem ruim para as varejistas, as ações da Magalu caíram muito. Como a senhora vê o cenário de inflação e juros mais altos?

Inflação a gente já estava até esperando, porque toda pandemia dá uma inflação porque diminui o produto. Não se fabrica o que precisa, então está no mundo inteiro. O que acontece no Brasil é que a gente tem que conter a inflação com juros altos. Saímos de um dígito para dois (em juros) muito rapidamente. A área de varejo vendeu muito na pandemia. Quase triplicamos as vendas. Faturamos R$ 54 bilhões ano passado. E aí, lógico, vem a ressaca.

Tanto é que a linha de roupa, de sapato, está vendendo mais que TV, computador, coisas de casa que as pessoas trocaram. Agora, as ações, eu nunca mandei ninguém comprar ação. Quando dá baixa, sou a primeira e minha tia (Luiza, fundadora da rede) a comprar. E, para te falar a verdade, nem olho isso. O importante é que a empresa está com caixa muito bom, graças a Deus.

Estou até indo a campo fazer a caravana. Sou garota-propaganda. A empresa é sólida, é moderna, foi uma das primeiras de lojas físicas do mundo que se digitalizou sem largar a loja física. A gente já sofreu esses altos e baixos de Bolsas. Sou diplomada nisso.

Em maio, começou a rodar a Caravana Magalu, da qual a senhora é a garota propaganda, para captar novos vendedores para o marketplace da empresa. Por que os pequenos são tão importantes para a Magalu?
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Sempre o Frederico (Frederico Trajano, filho de Luiza e CEO da empresa) falou: “A gente vai digitalizar o Brasil pequeno e médio”. Primeiro que faz parte da nossa missão digitalizar o Brasil. Segundo, que o marketplace é o nosso foco, certo? Nós vendemos de tudo no aplicativo. E aí a gente resolveu ir para lugares que estão pouco digitalizados no Brasil.

A gente atingiu 200 mil sellers (vendedores no marketplace). Hoje estamos comemorando. Nós não somos mais uma empresa de varejo. Nós somos um super app. A gente comemorou no rito, batemos palmas (a marca dos 200 mil vendedores). Ter seller conosco vendendo através do Magalu é um dos nossos objetivos. E a gente cresceu muito.

Foi a primeira vez que o Frederico me usou como garota propaganda mesmo. Eu faço filme, estou no outdoor, na rádio convidando. E a gente vai estar olho no olho. Eles (empresários) vão poder ver cursos que nós compramos, o que eles podem fazer, gratuito. Eu vou ser madrinha da loja física deles. Tem uma identidade.

O Magalu foi muito pioneiro na digitalização. Qual é a sua relação com a tecnologia?
Eu sempre fui muito novidadeira. Eu nem conseguia escrever um livro porque amanhã já tinha acabado o ontem para mim. O (Pedro) Bial é que foi persistente. Eu mesma dei pouquíssima entrevista no livro.

Eu dei mais agora que estou defendendo os livreiros. Aí, eu sempre comprei tudo o que é novo, celular, tablet. Mas eu nunca, até uns oito anos atrás, tinha entrado nas redes sociais. Aí eu pedi ao meu netinho que, na época tinha 5 anos, o mais velho disse: “Treina, treina, treina todos os dias, não desiste”.

Eu faço as minhas redes sociais. Eu acompanho, eu respondo e eu fui aprendendo. Não sou uma expert, mas eu aprendo e sou esforçada para aprender, sabe? Quando eu abri meu Instagram, minha filha falou “Puxa, que fotos horríveis e você ainda abre?”. Eu falei: “Menina, eu sou pública”. Você aprende.

Eu fico curiosa descobrindo o que lança o que não lança, como que faz, como que o story fica melhor, não fica. Sou curiosa. Me exige muito mais do que um jovem que já sabe. Mas eu falo nas minhas palestras: “Se eu consegui, qualquer um consegue”.

E como é a campanha com os livreiros?
Antes de pensar no livro, logo que começou a pandemia, logo que comecei o Unidos pela Vacina (movimento para ajudar a levar a vacina da Covid a todo o Brasil), eu fui convidada por vários grupos, cientistas, médicos, inclusive livreiros. Essas lives. E lá eu descobri uma coisa, gente: o que acontece em um país em que o livro é muito importante? Durante um período que você lança o livro, de seis meses a um ano, ninguém pode abaixar o preço do livro. Porque se abaixar, quebra os pequenos.

Fiquei sabendo nessa live (com os livreiros). Como eu sou comerciante, entendi rápido. Os grandes colocam isso como chamariz, a gente chama de boi de piranha. O livro está vendendo muito, eles abaixam o preço para poder chamar outros livros. Aí os pequenos quebram. Fiquei com isso na cabeça. Quando veio meu livro, eu achei que pudesse vender. Eu perguntei para a editora o que poderíamos fazer. Junto com um advogado nosso fizemos um contrato que se abaixar (o preço) o livro, ela (a loja) para de receber. É o único jeito que eu posso.

Outra coisa que eu cuidei foi de logística. Antes de lançar, eu queria que estivesse em todas as pequenas livrarias do Brasil inteiro. Eu acompanhei. Todo mundo queria que eu lançasse na Arena Magalu, que é imensa aqui, toda digital. Eu falei que não, quero lançar numa livraria, e lancei na da Cultura, que foram 1.500 pessoas. Compraram de tudo.

E agora aonde eu for eu vou lançar em uma livraria, pequena que seja. Não dei livro para ninguém, nem para minha assistente. Eu digo para elas comparem na livraria. É mais uma causa que eu estou pegando e parece que aí todo mundo começa a entender, porque eu sou boa para explicar, né.

Como estão enfrentando a concorrência das varejistas asiáticas? A Shopee chegou a superar a Magazine Luiza no download de aplicativos.
A concorrência sempre é saudável, eu nunca deixei falar mal de concorrência, mas acho que tem que ter o mesmo jogo. Se é para não pagar (imposto), que ninguém pague. Se é para pagar, que todo mundo pague. É o que IDV (Instituto para Desenvolvimento do Varejo) está lutando.

Como é que pode chegar de fora, não gera emprego aqui e, de repente, não tem a mesma igualdade de deveres (tributários). Por exemplo, não paga imposto e a gente, o varejo, paga 38%, 40%. Então, ninguém do varejo está contra a concorrência. Estamos contra a desigualdade que existe.

O Magazine Luiza fez várias aquisições sobretudo nesse momento de digitalização. Vai seguir o ritmo ou pisar no freio com a economia mais desaquecida?
Independentemente da economia, nós sempre crescemos e estruturamos. Negócio bom a gente compra. As nossas empresas (compradas pela rede), acho que foram 21 nesses últimos três anos, foram dentro de três pilares: tecnologia, para facilitar cada vez mais; diversidade, maior número de produtos, no Magalu tem de tudo, foi o nosso lema; e na parte de logística. A gente abriu 140 lojas físicas por ano nestes últimos três anos. Agora, nós vamos abrir mais 40 a 50 neste ano ainda.

Valeu a pena ter ido para o Rio?
Ah, a gente ama ter ido para o Rio. A gente tinha muito medo de segurança, minha tia até, né? (Luiza Trajano já falou que a rede não vinha para o Rio porque sua tia, fundadora da empresa, tinha medo de assaltos). E o Rio não tem nada mais do que a gente vive, sabe.

Quero tirar essa imagem do Rio. Lógico, tem assalto em loja por causa de celular. Mas o Rio não tem mais do que outros estados. Esse sempre foi o medo da minha tia porque ela sempre foi muito preocupada com a vida dos funcionários, dos clientes.

O programa para trainees negros criou muita polêmica quando foi lançado. Três anos depois, quais foram os resultados? E quais são os próximos passos?
A gente faz o que sempre fez essas frentes. Eu fiz de mulher, quando na época não tinha mulher. Há 13 anos, eu saí falando que era a favor de cota. Apanhava. Apanhava da própria mulher. Meritocracia, né. Está bom, então. Oportunidade para todos. Depois, coloquei a questão da violência contra a mulher dentro da empresa com linha direta, diversidade, aqui é proibido. Uma das nossas normas é proibido qualquer tipo de preconceito. A gente tem depoimentos maravilhosos aqui.

Aqui na empresa eu tenho o destaque do mês. Vários de todas as áreas. E eu comecei a ficar impressionada que a hora que eu dava a palavra, bem bate papo, “Eu entrei grávida, sou muito grata”. A gente faz tão naturalmente que eu falei para o TV Luiza pegar uns depoimentos de duas grávidas porque todo destaque tem duas agradecendo, porque eu quero até mostrar para os meus companheiros que, quando contrata grávida ela fica tão grata que vira destaque (ou seja, funcionário com bom desempenho dentro da empresa).

Esses dias eles fizeram um filme sobre as grávidas. Comecei a perceber que as grávidas entravam, tinham o bebê e depois queriam produzir tanto que virava destaque e eu nunca pensei nisso.

Vou falar do negro. Eu sempre trabalhei o movimento negro, mesmo no Mulheres do Brasil. Eu falava para a diretora de RH: “Põe mais dois, três trainees que eu pago do Conselho. Vamos botar trainee negro, não aparecia”.

Aí o Frederico fez uma estatística em janeiro de 2019 e viu que tem muito negro até gerente, mas não tem de diretor executivo e falou para elas. Elas disseram: “Olha, a Luiza sempre pede e nunca aparece”. Ele teve a brilhante ideia de fazer um treinamento só para negros. E quando foi uma sexta-feira às 15h ele lançou e me chamou. Foram 72 horas que eu nunca vi tanta paulada na minha vida, foram profundas, não compra mais, muito foram agressivos. Aí no domingo o Frederico mandou uma carta “Gente, estou querendo mudar a minha empresa, não estou querendo mudar o mundo”. Quem não quiser, não muda, ele quis dizer. Que ele assustou um pouco até.

Agora vou te contar os ganhos. Em um ano que eles ficaram aqui (os trainees), eles fizeram um documentário de 20 minutos que eu transformei em três e mostro nas minhas palestras. Vocês não acreditam. Não tem ninguém que não se emocione, mesmo aqueles que acham que é mimimi. É uma coisa tão verdadeira. O que ganhamos? Primeiro, que o nível deles é maravilho. Quando sobra 30 para 20 vagas, quem entrevista os 30 são os executivos. E na época eles disseram que tinha horas que tinham que desligar o vídeo de tão emocionados que ficavam. Se você vier ao Magazine, tem muito colorido e, além disso, representam muita a parte da população.

A gente começou sem pedir inglês completo. Não teve um que que não tinha, olha que interessante. A única coisa que aumentamos foi a idade, porque como eles não tinham oportunidade levamos até 27, 28 anos. E eles vão rapidamente para cargo mais alto. O mundo inteiro pede opinião para nós. O mundo inteiro.

Eu fico surpresa agora que ganhei estes prêmios. Ganhei prêmio na Inglaterra, pela Financial Times, entre as 25 mulheres mais… e pela Times, e pela Câmara Econômica Brasil- EUA. Então, eu dei muita entrevista internacional. É impressionante o que eles falam do programa de trainee. É um ganho muito grande.

A empresa lançou um programa para pessoas mais velhas. É uma iniciativa que veio do Mulheres do Brasil?
O grupo Mulheres do Brasil tem um comitê de 50+ e a gente trabalha muito isso. O Magazine ajuda Mulheres e o Mulheres ajuda o Magazine. Eu não dependo de uma coisa para fazer. Nós começamos em Franca, no SAC, botar pessoas de 50+ e tem sido uma experiência muito legal. Estamos fazendo um período de experiência para depois aumentar.

Pensa em se aposentar um dia?
Não penso, não. De jeito nenhum. Acho que se eu ficasse à toa, eu daria tanto trabalho para todo mundo, para os meus filhos. Eu não tenho muito tempo, é uma delícia. Acho que nem dá muito tempo de pensar na velhice. E eu faço com muito amor tudo o que eu faço, sabe? Eu faço para os outros o que gostaria que fizesse para mim.

Fonte : https://economia.ig.com.br/2022-07-11/luiza-trajano-economia-compra-acoes-magalu.html

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