Criar uma visão integrada e uniforme de CX, envolvendo todas as áreas de negócio, é condição básica para garantir a saúde das empresas.
A simples intenção de construir uma estratégia omnicanal dentro de uma empresa é um elemento disruptor e profundamente inquietante. A omnicanalidade pressupõe estar disponível para o cliente no momento e no canal que ele deseja. Logo, por mais que as empresas busquem alternativas para racionalizar os custos decorrentes da oferta de canais, no atendimento, bem como na integração desses canais, a disponibilidade é uma imposição que não obedece às normas e aos ritos estabelecidos. Ela obedece aos caprichos do cliente, empoderado, impaciente, intolerante e incansavelmente insatisfeito, ainda mais em tempos de polarização exacerbada.
Há pouco mais de dez anos, quando a ideia da “empresa onipresente” nasceu, havia uma premissa ingênua de que, usando as tecnologias certas e o poder da internet, seria possível encantar o cliente e obter fidelidade e recorrência em escala volumosa, mudando negócios de patamar. Assim, a omnicanalidade seria a quimera de empresas mais competitivas e fortemente lucrativas. Mas é claro que essas promessas nunca contam toda a história.
Antes de mais nada, eficiência custa, e custa caro. Até uma empresa colher os benefícios de uma estratégia omnicanal bem construída e eficiente, há muito investimento, muito estresse de implementação, muito tempo desperdiçado e, sobretudo, muita exposição à insatisfação do cliente que não entende por que, repentinamente, as coisas ficaram “mais difíceis” nas interações com as empresas.
A omnicanalidade também impõe mudanças de cultura, alterações bruscas de processo, falhas tecnológicas e incontáveis desafios e tarefas para as quais a empresa normalmente não se preparou. O processo não vem com bula e normalmente faz com que as empresas mudem de avião enquanto estão voando. Muitas caem, outras tantas sofrem avarias e poucas conseguem o voo de cruzeiro rumo ao éden do cliente satisfeito e feliz, recorrente e encantado.
Pois bem: Se o processo é tão doloroso, vale a pena ser omnicanal?
A pergunta merece uma resposta direta e sem rodeios: não há escolha. Salvo empresas monopolistas em segmentos fortemente regulados que impeçam o surgimento de competição, ou aquelas ainda em estágio muito simples de desenvolvimento e atividade, todas as demais devem, obrigatoriamente, ser omnicanais. É o preço para garantir que o cliente as veja como minimamente em condições de estarem no mercado. E adotar uma estratégia de onipresença demanda recurso e uma adequação cultural significativa. Assim, é necessário desenhar o mapa de canais, o grau de interação destes canais, quais deles serão mais aderentes aos diferentes perfis de clientes, quais são os fatores críticos da experiência do cliente, se irão permitir transações ou se serão apenas canais de consulta e serviços.
Ou seja, a omnicanalidade é um processo estabelecido by design ou, como a Consumidor Moderno mostra nesta edição, um sistema orientado a potencializar uma experiência do cliente sólida, atrativa e gratificante. Pouquíssimas empresas no mundo conseguem atingir o estado da arte do CX, estabelecido como um sistema de canais orquestrados, que oferecem um padrão elevado de serviço e fazem com que o tempo do cliente seja recompensado.
A dificuldade de estabelecer omnicanalidade by design, com foco na oferta de uma experiência do cliente motivadora e sempre estimulante, está justamente na maneira pela qual as organizações estruturam suas operações e atividades: a partir do velho modelo linear e sequencial, no qual as áreas de negócio – Marketing, Vendas, Atendimento, Operações, Inovação e Digital – transbordam e repassam tarefas, com foco no produto e no jogo de custos e margens, sem realmente construir uma equação de valor que faça sentido para o cliente.
Mas, estamos vivendo tempos difíceis, de grande mudança de padrões de competição, novos comportamentos, questões de identidade, agenda ambiental, busca por impacto social, inflação global, home office e modelos híbridos de trabalho, questionamento do consumo exacerbado, uma infinidade de temas que inundam a agenda corporativa com pressões e demanda por decisões rápidas, praticamente em tempo real. Logo, a ideia de omnicanalidade, ainda que fortemente sedutora, aliada à imensa capacidade de geração de valor da experiência, passa a ser um item secundário nas áreas de negócio, completamente absorvidas por tarefas que deslocam a visão da empresa do seu ativo crucial: o cliente.
Omnicanalidade é fruto da experiência. E experiência só acontece a partir do posicionamento do cliente no centro do negócio. Uma visão radial e simultânea, na qual as áreas de negócio atuam de forma circular, multidisciplinar e orientada a tornar a vida do cliente mais confortável, mesmo que isso demande uma revisão completa de processos. Integrar Marketing, Atendimento, Vendas, Produto, Inovação, Digital e TI para que comunguem de uma visão consensual e ambiciosa de CX é o desafio da liderança ativa, aquela que não procura entregar resultados a partir apenas do corte indiscriminado de custos, mas, sobretudo, aquela que está empenhada a trazer valor para o negócio, entregando valor percebido para o cliente.
É hora de olhar para dentro e descartar todas as tarefas que desvirtuam e destroem o valor do negócio, entregando apenas aborrecimento e elementos que geram a insatisfação do cliente. Na era do pós-consumidor, a experiência fluida, perfeitamente distribuída entre canais transacionais e relacionais, é atributo de empresas inquietas, paranoicas e que fazem questão de se manter relevantes em qualquer cenário.
Fonte : https://revista.consumidormoderno.com.br/experiencia-do-cliente-todas-areas/edicao-272/?utm_campaign=news-cm-060822&utm_medium=email&utm_source=RD+Station