A quinta edição da Conferência Santa Catarina foi recheada de novas tendências para o setor de e-commerce. Entre as novidades, destacou-se a necessidade de discutir os termos já usados pelo varejo, como “omnichannel”, e sua real aplicação na realidade brasileira. Uma das figuras a levantar a discussão sobre como a revolução digital e as novas tendências podem ser aplicadas no Brasil foi Erick Melo, Co-fundador e CCO da WebJump.
O executivo esteve na NRF 2020, maior evento de varejo e tecnologia do mundo, em fevereiro e se inteirou das novidades do setor aplicadas mundialmente. Ele percebeu que as tecnologias varejistas levam a uma realidade cada vez mais integrada.”Não se fala mais de varejo físico ou de varejo eletrônico, fala-se de comércio em si”, explica.
Durante o evento, que foi realizado nos Estados Unidos com palestras e exposições de todos os lugares do mundo, Melo viu a atuação de robôs e drones como exemplos de soluções para o varejo físico. Dessa forma, essas ferramentas, vistas até então como elementos de disrupção do comércio eletrônico, tornaram-se capazes de otimizar processos e integrar o varejo físico ao digital com mais facilidade.
Cultura continental x cultura bairro a bairro
O primeiro ponto de atenção para o questionamento de Erick durante a palestra em Florianópolis foi sobre como implantar a tecnologia e a transformação de acordo com as necessidades do Brasil. O primeiro fator é entender a cultura do país e quais são as necessidades específicas dos consumidores que cada negócio deseja impactar.
Isso porque, de acordo com o CCO, o Brasil é um país que se destaca entre os demais pela “diversidade cultural enorme”. Ele falou ainda sobre a dificuldade de trabalhar em um país continental, não só pelas diferenças entre as regionais, mas em uma escala ainda menor: bairro a bairro de uma mesma cidade. “Quando pegamos uma tecnologia de um país tão grande como os EUA, precisamos adaptá-las às nossas necessidades”, defende Melo.
Segundo ponto de atenção: seu varejo está pronto pra isso?
“O varejo não vai acabar do dia pra noite”, explica o executivo. Ele diz que há alguns anos as previsões para o varejo físico se mostravam realmente pessimistas, fazendo os empreendedores acreditarem que o online seria a morte da loja. No Brasil e em diversas outras partes do mundo, no entanto, o varejo físico se mostrou um importante ambiente para a experiência do consumidor. Ele defende que daí surge a importância de pensar o omnichannel: o varejo físico e o digital precisam fazer parte de uma mesma realidade, visando a conveniência do cliente, e não precisam mais ser vistos como concorrentes.
Sendo assim, muitos questionam se as tecnologias disruptivas expostas na NRF funcionam para todos os mercados, ou se será necessário adaptá-las ou até mesmo recriá-las no Brasil. Exemplos: experiência de self-checkout no Brasil vai funcionar?
O self-checkout ficou muito conhecido nos Estados Unidos pelas lojas de compras rápidas da Amazon. Atualmente populares em diversas marcas, elas não precisam de um funcionário para passar as compras no caixa, mas os próprios consumidores realizam o pagamento de maneira digital. Melo citou alguns exemplos desse tipo de experiência que fracassaram no Brasil, pois muitos dos consumidores saem sem de fato pagar pelo consumidor.
Mesmo assim, ele diz que vale a pena explorar alternativas para isso por aqui: “eu prefiro acreditar nas pessoas que pagaram”, pois elas mostram que existem clientes engajados dispostos a experimentar mudanças.
Ele usa como exemplo ainda os caixas eletrônicos, que vieram para o Brasil em 1983. Muitos consumidores não acreditaram que a tecnologia fosse funcionar, enquanto outros questionam o que seria dos funcionários nas agências. Hoje, existem os dois para diferentes necessidades, sendo que o trabalho dos funcionários se modernizou e contempla diversas outras funções.
A importância da experiência do consumidor hoje: dados aliados à personalização
Outro argumento de Melo sobre a integração omnichannel ser a principal e mais importante tendência do varejo é sobre a experiência do consumidor. Ele defende que a partir disso é possível coletar dados que facilitam a personalização do atendimento e da sensação que a compra pode gerar.
O executivo ouviu na NRF que a designação online e offline está cada vez mais ultrapassada e que muitos dos especialistas simplesmente se referem ao assunto como “commerce”, pois o vêem como uma só estrutura. A partir disso, empresas como Walgreens — uma das maiores redes de farmácia norte americana — e a Domino’s Pizza precisaram reestruturar suas operações. No caso da primeira, mesmo sendo uma referência muito procurada em ambientes tradicionalmente físicos, hoje tem 76% de suas compras iniciadas online, seja pela pesquisa, compra online e retire na loja, ou por ter sido impactado por algum anuncio online.
Já no caso da segunda, Dennis Maloney, CDO da empresa, afirma que a Domino’s tornou-se uma empresa de tecnologia, sendo sua essência ainda a entrega de pizzas, mas tendo como nova cultura o padrão de consumo propiciado pela transformação digital. De acordo com Melo, a empresa “entendeu a impaciência, a demanda de alta qualidade do consumidor e entendeu que era necessário repensar a maneira como atuava” no mercado norte-americano.
Ferramentas digitais no varejo físico
Parte do processo de integração está ainda em usar no ambiente físico ferramentas desenvolvidas para a coleta de dados do digital. Um dos exemplos são os mapas de calor, que, a partir de câmeras, verificam os locais da loja e das prateleiras que são mais acessados pelos consumidores. Dessa forma, o lojista consegue otimizar o espaço e coletar dados de preferência. Além disso, algumas das ferramentas identificam idade, gênero e humor das pessoas que passam pelo estabelecimento através da identificação biométrica. Para Melo, é “importante ter esse números no ambiente físico para ter uma melhor interação com o online”.
Outra ferramenta inteligente são os carrinhos de supermercado com sensores de geolocalização, que possibilita ao estabelecimento identificar quais são os corredores e caminhos pelos quais o consumidor passa. Melo defende que esse tipo de inovação prova que o varejo físico está longe de sumir, como defendido há alguns anos:”ninguém aqui acredita que a loja física vai morrer, mas sim que ela vai passar por uma transformação”.
O papel do B2B
Como visto em outras palestras, cresce também a participação da indústria nas possibilidades de compra direta ao consumidor, seja pelo ambiente físico ou digital. Uma das grandes dificuldades do setor, no entanto, é ter a habilidade que o varejo tem ao lidar com um público cada vez mais exigente. “Como estar preparado para isso? Fazendo um bom atendimento, fazendo a diferença”, diz o executivo.
Para a indústria, é muito mais difícil se adaptar e fazer mudanças em virtude do comportamento do consumidor. Para o lojista do comércio eletrônico, é muito mais fácil captar as necessidades e oferecer a experiência personalizada. Ele comparou a indústria a um transatlântico, muito mais difícil de se locomover e manobrar. Mesmo assim, existe grandes oportunidades no segmento. Para ele, o trunfo da indústria vai ser conseguir entregar um nível de experiência do consumidor semelhante ao que o varejo entrega hoje.
Era da hiper conectividade
Melo terminou sua palestra na Conferência com uma provocação: “as pessoas não decidem pensando, elas decidem sentindo”. Não importa, sob esse ponto de vista, entregar a transformação digital se o foco não for as pessoas por trás da tecnologia. Para este argumento, o executivo usou como exemplo a animação da Disney Wall-e, na qual um pequeno robô responsável por recolher o lixo dos humanos em futuro distópico percebe como humanidade destruiu o planeta e se rendeu à tecnologia, perdendo a essência do convívio humano.
Dessa forma, ele defende que, acima de tudo, a tecnologia precisa ajudar as pessoas. E o varejo, consequentemente, ao adotar a transformação digital, pode oferecer diferenciais para o bem-estar das pessoas. “Quantas vidas o negócio de vocês muda?”, ele questiona ao concluir a palestra.
Fonte : e-commerce Brasil