Cliente no centro? Por que essa estratégia já não basta

As empresas, hoje, vivem uma crise de relevância. Os investimentos feitos por elas não têm chegado às áreas que os consumidores dizem valorizar. Segundo dados de uma nova pesquisa da Accenture, 64% dos clientes gostariam de ver as empresas respondendo às mudanças em suas necessidades com mais agilidade. Ao mesmo tempo, 88% dos executivos acreditam que os clientes estão mudando em um ritmo que as empresas não conseguem acompanhar. E o mais surpreendente é a causa para essa discrepância: a insistência em ter o cliente no centro como única estratégia.

A conclusão é do estudo “Paradoxo humano: do cliente no centro para a vida no centro”, no qual a Accenture faz um alerta: “O velho método de ser relevante ficou obsoleto. É hora de adotar uma nova estratégia”. Dessa forma, colocar o ser humano, a vida – e não apenas o cliente – no centro torna-se o caminho para resolver o gap de relevância.

Fabio Nantes, responsável pelo Adobe Business Group LATAM da Accenture, explica: “Quando consideramos o cliente no centro, temos uma estratégia que prioriza a experiência e a conveniência. No entanto, ao colocar a vida no centro, passamos a aceitar os clientes como pessoas complexas e em constante mudança – e cujos comportamentos são profundamente impactados por forças externas imprevisíveis”.

A desconexão entre clientes e empresas – cliente no centro
A desconexão entre clientes e empresas. Fonte: Accenture

Ao colocar a vida no centro, as empresas passam a enxergar os clientes de forma mais holística, entender as mudanças em tempo real e, assim, entender os paradoxos do consumidor e, finalmente, satisfazer as suas mutáveis necessidades e prioridades.

Mas, para chegar a esse estágio, é preciso compreender o novo momento. “Antes, era fácil entender a jornada do cliente, bastava mapear o comportamento de consumo, a frequência e a forma que ele gostava de ser atendido”, afirma Nantes. “Mas aí, uma série de forças externas se apresentou: pandemia, guerra, ebulição na macroeconomia, na política e no meio ambiente. Todas essas forças começaram a influenciar a vida do consumidor e a jornada padrão deixou de ser realidade”, completa.

O consumidor paradoxal
Em um mundo que parece fora de controle, as pessoas buscam formas de se adaptar a uma realidade dominada por forças externas. Nesse contexto, nasce um novo consumidor que é multifacetado, complexo e paradoxal. Aliás, 69% deles acreditam que se comportar de forma inconsistente é tão aceitável quanto é humano.

São muitos os exemplos desse comportamento paradoxal. Ao mesmo tempo em que o novo consumidor quer priorizar a si mesmo, ele busca promover mudanças para os outros. “Ele também quer reduzir sua pegada ambiental, mas na hora de escolher entre o produto mais sustentável e o mais barato, ele muitas vezes é forçado a escolher o mais barato”, diz Nantes.

Curiosamente, apesar dessa inconsistência, a confiança nas decisões tomadas é uma característica forte do novo consumidor. Ao perceber a própria capacidade de adaptação, turbinada pela tecnologia, ele tem mais certeza das suas prioridades – ainda que elas sejam mutáveis. O estudo mostra que 61% das pessoas se sentem confortáveis mudando de prioridades quando novas circunstâncias se apresentam.

“A verdade é que o customer-centricity, sozinho, não dá conta dessa complexidade atual. Precisamos de um novo olhar, mais real e mais completo”, diz Nantes. “Sem o olhar life-centric, podemos cometer erros que nos tornam irrelevantes para o cliente – como continuar oferecendo carne a uma pessoa que se tornou vegetariana.”

See, Solve, Simplify
Para colocar a vida no centro e enxergar o consumidor como alguém multidimensional, a Accenture usa o framework dos três “S”: see, solve e simplify, ou, em tradução livre, enxergar, resolver e simplificar.

See: enxergar o cliente de forma completa
Modelos estatísticos, dados históricos, segmentação. A espera por uma jornada linear pode impedir que as empresas tenham insights e aproveitem as oportunidades que surgem da inconsistência do novo consumidor. O objetivo é deixar de enxergar os clientes como meros consumidores e passar a tratá-los como seres humanos em constante mudança. Isto é, enxergar nossos clientes não pelos produtos que compram, mas pela forma como os utilizam.

Um exemplo na prática é das empresas de cloud, que identificaram um alto custo de manutenção de seu licenciamento para clientes com uso flutuante. Desenvolveram, então, modelos comerciais que permitem pagar apenas pelo espaço utilizado, de forma flexível e periódica.

Fabio Nantes ainda faz um alerta quanto à personalização. “Tradicionalmente, para personalizar é necessário analisar o histórico de dados, entender a característica da pessoa. Isso é passado. A personalização é em tempo real. As empresas ainda estão olhando muito para o passado, mas o foco tem que ser o presente, que é mutável e inconsistente. A comunicação tem que estar em linha com o que acontece agora”.

Solve: soluções para cenários mutáveis
Após enxergar o cliente de forma mais humana, é preciso entender como criar soluções acessíveis com foco na vida. Isso significa estar em linha com os comportamentos paradoxais atuais e apresentar opções relevantes de produtos e serviços que satisfaçam essas necessidades mutantes.

Simplify: simplificar para ter relevância
Fazer o básico bem-feito e seguir o objetivo de ser simples. Em meio à confusão cotidiana, vence quem facilita a tomada de decisões e simplifica a vida. Não à toa, o PIX fez tanto sucesso: lançado pelo Banco Central em meio às dificuldades da pandemia, desburocratizou o processo de pagamento e se manteve acessível de forma geral.

Na prática: a vida no centro
Mudar o mindset significa, antes de tudo, conscientizar a empresa internamente quanto ao novo cenário. Equipes devem estar capacitadas para se posicionar de uma forma ágil e com fluidez. Só assim conseguirão colocar a vida no centro, como fez a Accenture no projeto de uma grande varejista de moda latino-americana.

“Entendemos que precisávamos apoiar o cliente a enxergar seu target de maneira completa – novos momentos pessoais e, principalmente, como estavam se comportando em termos de consumo no o atual cenário macroeconômico, político e ambiental. Depois, veio a tecnologia para consolidar os dados. Sugerimos a implantação de uma CDP (Customer Data Platform), solução que passa a identificar, em um único repositório corporativo, a raiz central do consumidor, seu comportamento de compra, frequência, preferência, tudo em tempo real. Ou seja, mostrando o que se passa na vida desse consumidor hoje e agora”, conta Fabio Nantes.

Com essa abordagem, a empresa passa a planejar campanhas proativas de relacionamento com base em perfis cada vez mais alinhados com a realidade de cada consumidor.

Para as empresas que não sabem por onde começar, Fabio Nantes deixa um recado: “Abra a cabeça para o novo, não fique achando que todas as teorias que até então eram verdadeiras continuam sendo. Trate o cliente como um ser humano, que tem emoções, sentimentos, que muda de comportamento e está de bem com isso. Assim, coloca-se a vida em destaque e, naturalmente, consegue-se crescimento por meio da relevância”.

Fonte : https://www.consumidormoderno.com.br/2022/10/31/%20cliente-no-centro-estrategia-nao-basta/

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