Vendedores do Mercado Livre são prejudicados com novo processo logístico imposto pela plataforma

Método logístico mistura produtos dos comércios parceiros com encomendas do
Mercado Livre. Insegurança dos vendedores em deixar as mercadorias é enorme.

Com a nova regra exigida pela empresa, os sellers, como são chamados os vendedores no Mercado Livre, terão que se deslocar com as suas vendas aos pontos direcionados pelo Mercado Livre, sem segurança e com recursos próprios.

O Mercado Livre investiu em Centros de Distribuição, tirou a autonomia dos seus vendedores de escolherem a transportadora que melhor os atendiam e os direcionou às Agências Mercado Livre, que na verdade são pontos de terceiros, onde uma contratada, chamada Kangu, se conveniou ao ML para captar estas postagens.

A atitude da maior plataforma do Brasil em tráfego de busca está tirando o sono de boa parte dos profissionais vendedores que atuam, muitos deles, desde a fundação do Mercado Livre em 1999. Na época, sem credibilidade, houveram diversos casos de compradores que receberem uma pedra, em sua compra, no lugar do produto.

Atualmente as coisas mudaram, a empresa investiu em segurança; na compra através do Mercado Pago; obteve credibilidade com o Mercado Envios e muita escala com a política do frete grátis. Além disso, continuou inovando com o processo de armazenamento chamado Full, passou a fazer coletas e direcionar as entregas às mais variadas transportadoras.

Grupo ABC News passou um mês ouvindo diversos sellers da plataforma que, além de apontarem a forma unilateral que tudo aconteceu, relataram grande descontentamento por cada uma destas etapas.

Em tempos de COVID-19 veio a imposição deste novo método e dos seus desafios: o risco de contaminação no deslocamento até uma Agência Mercado Livre; o custo do transporte; a falta de segurança até o local devido à lugares duvidosos; a falta de documento fiscal ou recibo que comprove a entrega da mercadoria. Além disso, o vendedor não tem a opção de aceite às novas regras, tampouco alternativas para este novo método, o que causa estranheza e uma demonstração do desequilíbrio de forças entre a plataforma e os vendedores. A mudança é uma imposição da empresa que deixa a entender que: quem não gostar que “saia”.

“Muitos vendedores foram obrigados a entregar pacotes em ponto de coletas muito distantes do seu local de trabalho ou residência. O valor das vendas não justifica pagamento de táxi ou Uber para ir e voltar. E ainda, até chegar ao ponto de coleta, o vendedor corre o risco de furto ou roubo. Muitos não corriam esse risco porque tinham coleta dos Correios, onde eram retirados os pacotes na casa ou empresa do vendedor. O seguro só cobre os pacotes depois de bipados no ponto de coleta. O tempo para sair de casa e voltar, tem sido grande em muitos casos. Alguns têm levado uma hora e meia no percurso de ida e volta. Foram atribuídos pontos de coleta sem qualquer segurança, muito pequenos e que deixam os pacotes visíveis. Alguns são próximos a comunidades onde infelizmente a taxa de assalto é grande. O vendedor que é obrigado a ir de carro, pela distância, não encontra local para estacionar, tendo que deixar o veículo em local proibido, infringindo a lei e arriscando ser multado”, desabafa Adriana Lima, administradora do grupo Vendedores do Mercado Livre no Facebook.

Os impactos de atrasos, não estão sendo retirados, a menos que o vendedor abra um chamado, o que, segundo eles, é algo bem difícil, porque raramente há atendente disponível e, por e-mail o atendimento é “deplorável”, conforme um dos vendedores. O vendedor faz uma requisição e recebe uma resposta copiada e colada que nada tem a ver com a questão levantada. Todos os vendedores que possuíam coleta dos Correios estão sendo muito prejudicados, pois o serviço era perfeito.

Os vendedores que não tinham atrasos também foram obrigados a aderir, ficando à mercê do trabalho do parceiro do Places e de quem irá coletar nesses locais. Trocou-se um serviço impecável, por um serviço arriscado, que ainda traz ônus ao vendedor com órgãos como PROCON. As vendas de muitos diminuíram. Alguns compradores perguntam antes da compra se a entrega é pelos Correios ou transportadora. Quando o vendedor responde que está na coleta e que a entrega pode ser feita por ambos, o comprador desiste, pois não quer receber a compra por transportadora.

“Estamos bastante preocupados com a insegurança tributária e responsabilidade civil sobre esta mudança. A plataforma se apresenta sempre como intermediadora em qualquer demanda com os órgãos fiscalizadores e de defesa do consumidor, como o PROCON, se isentando de responsabilidades nas operações realizadas dentro da sua plataforma, transferindo todas as obrigações e ônus para os vendedores. Assim apesar de a plataforma alegar que a responsabilidade é do vendedor desde a origem do produto até a efetiva entrega ao comprador, na prática, este não tem o domínio da cadeia logística de distribuição, a qual é controlada pela plataforma, devendo ser limitada a responsabilidade civil do vendedor, apenas e tão somente, à venda”, observa Dr. Carlos A. Mendes, do Departamento Jurídico da Associação dos Vendedores do Mercado Livre.

Ainda, segundo Adriana Lima, as transportadoras têm serviços precários. Marcam como entregues pacotes não entregues, jogam a carga na garagem ou quintal do vendedor e não exigem assinatura na entrega, dando margem ao comum “Golpe do não recebimento”. E isso ainda abre precedentes para o vendedor que recebe o pacote e abre reclamação, dizendo que não recebeu, aproveitando-se do fato de não haver nenhum tipo de prova. Somente o RG do vendedor no aplicativo não quer dizer que o cliente recebeu, pois o próprio site possui os dados do cliente. A assinatura no ato do recebimento é indispensável. “Quando o vendedor tenta pedir o nome de quem assinou às transportadoras não consegue passar, pois o contrato não está em nome dele. O site também não acata o pedido do vendedor. Ao invés de solicitar ajuda da transportadora, devolve o dinheiro ao cliente, o que está estimulando o aumento dos golpes. O comprador beneficiado conta aos amigos e familiares que ficou facilmente com o produto e com o dinheiro, estimulando outros a realizarem compras fraudulentas”, diz Adriana Lima. E continua: “Foram escolhidas transportadoras sem a mínima condição de atender a demanda com qualidade. Transportadoras como a SEQUOIA nem sequer têm um telefone de contato e não responde e-mails enviados pelo vendedor, nem quando acompanhadas de notificação extrajudicial”

O site não traz na tela a opção de aceite às novas condições impostas, como fazem outros marketplaces que apresentam a mudança e colocam a tela de aceite com vários dias de antecedência. Muitos vendedores são pegos de surpresa e não têm tempo de enviar uma notificação extrajudicial para tentar a isenção, como foi o recente caso de uma senhora de 74 anos, com depressão, que foi obrigada a mudar para o Places tendo recebido o aviso da imposição com apenas dois dias de antecedência. Ela não tinha atrasos em suas postagens, com raras exceções de problemas com etiquetas, o que foge de sua alçada. “A insegurança jurídica é um elemento constante nas relações entre vendedores e a plataforma, obrigando nossas assessorias jurídicas e contábeis a trabalhar sem descanso nestas demandas”, comenta o responsável jurídico da Associação dos Vendedores do Mercado Livre, Dr. Carlos A Mendes.

Mercado Livre e Mercado Financeiro

Tantas mudanças fizeram com que o Mercado Livre visse suas ações dispararem em 25,46% na bolsa Nasdaq em plena pandemia, ao divulgar seu balanço no último trimestre e ser o líder do e-commerce brasileiro com 33% do mercado (infoMoney). Os vendedores que postam nas agências dos Correios são 32% dos movimentos das encomendas nas agências próprias e franqueadas, e a saída destes clientes deixará o equilíbrio econômico das agências comprometido.  Esse crescimento do Mercado Livre deve-se muito, a esses sellers, que ajudaram e ajudam os resultados da plataforma serem tão positivos e robustos. “Com todos os resultados positivos do Mercado Livre a plataforma nem ao menos orienta como proceder ao lançamento do frete, ou não, na nota fiscal, visto que o valor não entra em sua conta corrente, não podendo, portanto, ser tributado sobre tal valor. Não bastasse, temos ainda o agravante de a plataforma tratar pessoas físicas e jurídicas da mesma forma”, finaliza o advogado Dr. Carlos A. Mendes.

Grupo ABC News entrou em contato com todas as empresas citadas pelos vendedores (Kangu, Sequoia e Mercado Livre) e como eles, também tivemos grandes dificuldades de contato e nenhuma resposta foi encaminhada. Tentamos por e-mail, pelo canal Entre em contato no site, até mesmo pelo próprio WhatsApp de uma delas, mas nenhum retorno foi dado até o fechamento da matéria.

Fonte : grupoabcnews.com.br

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